participei do projeto Margaridas entre março e agosto de 2008. um programa do HRAN de atendimento a mulheres em situação de violência conjugal, que é uma forma - entre tantas - de violência sexista, muito favorecida pelas assimetrias entre mulheres e homens que são criadas por y criam nossa sociedade. meu trabalho lá foi, basicamente, o de propor e executar uma oficina de leitura y produção de textos com as 6 participantes, todas com históricos de vida, trajetórias, formação muito diferentes.
um dos primeiros entraves foi a barreira da língua. algumas simplesmente não queriam escrever. o que é mais que compreensível, mas mesmo alarmante porque, além da questão da barreira lingüística que implica, tem também a ver com a questão do silenciamento feminino: como dizer praquelas mulheres, que viviam, algumas, há mais de uma década com um marido espancador, que agora elas poderiam dizer o que quisessem, o que pensassem, o que sentissem, e que isso ia ser valorizado, escutado, importante pra construir, naquele espaço, um lugar de compartilhamento de experiências e possibilidades?
romper o silêncio era nossa tarefa semanal. tanto o silêncio corpóreo esboçado em posturas recurvadas, vozes que não ousavam falar muito alto, olhares vacilantes, quanto o silêncio de um vácuo cognitivo que impedia a percepção das agressões físicas, morais, psicológicas, afetivas, patrimoniais como formas de violência contra a vida íntegra de cada uma de nós ali presentes, e não como castigo, punição ou contrapartida sacrificial da relação amorosa, artifícios pra manutenção de mulheres e homens em papéis rígidos y desiguais.